Aplicação de pastilhas de cerâmica sobre MDF
(Fernando Sabino)
De repente, a salvação lhe apareceu na forma de um americano, que lhe oferecia emprego numa agência. Agarrou-se com unhas e dentes à oportunidade, vale dizer ao americano, para garantir na sua nova função uma relativa estabilidade.
Um belo dia vai seguindo com o chefe pela rua, quando vê do outro lado da calçada um preto agitar a mão para ele.
Era o sambista seu amigo. Ocorreu-lhe desde logo que ao americano poderia parecer estranha tal amizade. Lembrou-se que os americanos em geral têm uma coisa séria chamada preconceito racial. Pôr via das dúvidas correspondeu ao cumprimento de seu amigo da maneira mais discreta possível, mas viu em pânico que ele atravessa a rua e vinha em sua direção, sorriso aberto e braços prontos para um abraço.
Pensou rapidamente em se esquivar, mas não dava tempo: o americano também se detivera vendo o preto aproximar-se. Agora com o gringo ali a seu lado, todo branco e sardento é que percebeu que o amigo não podia ser mais preto. Sendo assim, tivesse paciência: mais tarde lhe explicava tudo, haveria de compreender. Passar fome era muito bonito nos romances, lidos depois do jantar e sem credores à porta. Não teve mais dúvidas: virou a cara quando o outro se aproximou e fingiu que não o via, que não era com ele.
E não era mesmo com ele. Porque antes de cumprimentá-lo, talvez ainda sem tê-lo visto, o sambista abriu os braços para acolher o americano- também seu amigo.
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